Rosilda Cavalcanti
A revolta do Quebra-Quilos ocorreu no nordeste do Brasil, entre fins de 1874 e meados de 1875. Foi uma reação contra os decretos para a implantação do sistema métrico-decimal, para os pesos e medidas, em todo o império. Neste período, havia uma grande variedade de pesos e medidas, mas a população estava acostumada com as medidas desde muitas gerações. A tentativa de implantação do novo sistema métrico no país provocou revolta em diversos lugares. De modo indireto, outros fatores influenciaram às revoltas:- A questão religiosa conflito ocorrido no Brasil na década de 1870 que se iniciou com um enfrentamento entre a Igreja Católica e a maçonaria e acabou se tornando uma grave questão de Estado. Bispos e padres foram acusados de incitarem o povo a revoltar-se.
- As hostilidades entre o Partido Conservador e o Liberal. Em Pernambuco, a responsabilidade pela revolta é posta nos liberais porquanto os conservadores estão no poder. A Província, jornal liberal veiculado em Pernambuco, dirige seus ataques aos conservadores e principalmente ao Presidente da Província Henrique Pereira de Lucena.
A revolta dos quebra -quilos se iniciou na Paraíba e se estendeu a outros estados nordestinos. Os revoltosos escolhiam em geral o dia da feira para os seus ataques, pois era por ocasião das feiras que se cobravam alguns impostos municipais, por exemplo o imposto do chão. A coletoria sofria ataques por conta do seu papel no lançamento dos impostos.
A Provincia- terça-feira 22 de dezembro de 1874 |
QUEBRA- QUILOS EM GARANHUNS
Decorria pacificamente a feira dia 19 de dezembro de 1874, quando ao sinal de Vitoriano Reinaldo de Freitas e Joaquim Bento de Cerqueira, um grupo iniciou a destruição das barracas e a quebra dos pesos e medidas.
De acordo com os jornais da época, ao grupo inicial, juntaram-se aproximadamente 600 pessoas. Uns saqueavam as mercadorias das barracas destruídas, outros dirigiam-se para o cartório e para a coletoria a fim de incendiar os prédios.
O delegado Tenente Manuel Candido de Albuquerque com seu pequeno destacamento, pouco pôde fazer. A superioridade numérica dos quebra-quilos obrigou-o a proteger a entrada da Câmara Municipal, da cadeia, dos cartórios, e da coletoria.
A feira ficou entregue ao deus-dará e os comerciantes também. Alguns jogaram imediatamente seus pesos e medidas nas calçadas. Outros , mais resistentes, foram intimados pelos quebra quilos a entregá-los sob ameaças.
Um grupo retirou do açougue público balanças, pesos e medidas. Outro grupo dirigiu-se a loja do Capitão da Guarda Nacional Pedro do Rego Chaves , conservador, líder político em Garanhuns, cognominado pelo Jornal A Província de "Pedro Quer". O grupo exigia-lhe a entrega de seus pesos e padrões de medidas.
As autoridades locais, o vigário Pedro Pacífico de Barros Correa, o escrivão Capitão Vila Nova, juntamente com as pessoas de mais influencia econômica da cidade, usando de diplomacia quase que conseguiram demover os quebra-quilos. Depois de conversarem , houve até vivas de parte à parte.
Estavam os mantenedores da ordem muito satisfeitos por ter tido o levantamento do povo um desenlace tão agradável quando de novo volta um grupo à casa do Capitão Pedro Quer, para que este lhes entregasse os pesos, medidas e a caixa dos impostos.
O delegado , Tenente Manoel Cândido de Albuquerque , correu para exigir dos revoltosos o cumprimento do acordo feito anteriormente, três deles o atacaram. Defendeu-se o tenente com a espada., porém o chefe quebra-quilos Joaquim Bener de Oliveira o prostrou com profundo golpe de foice na omoplata.
O delegado , Tenente Manoel Cândido de Albuquerque , correu para exigir dos revoltosos o cumprimento do acordo feito anteriormente, três deles o atacaram. Defendeu-se o tenente com a espada., porém o chefe quebra-quilos Joaquim Bener de Oliveira o prostrou com profundo golpe de foice na omoplata.
Iniciou-se a luta, e da gente armada que protegia a casa do Capitão Pedro Chaves partiram os primeiros tiros. Para se defender e para dispersar o povo que se tornava mais furioso, o tenente delegado mandou que seus soldados atirassem. Segundo o historiador Souto Maior, os revoltosos, ao que tudo indica, não estavam armados apenas com foices e cacetes, alguns tinham bacamartes e responderam ao fogo inimigo.
No combate morreram os dois chefes quebra-quilos e ficaram feridos cerca de 12(doze) pessoas, quase todos do grupo quebra-quilos. O soldado Manoel Francisco da Silva também morreu na luta.
Debandaram-se os quebra-quilos ao verem seus chefes mortos, porem os habitantes de Garanhuns estavam certos de que voltariam, e o juiz José Alves Lima Júnior imediatamente pediu reforços.
No dia seguinte, às seis horas da manhã, Miguel Reinaux Duarte - capitão secretário geral do comando superior da guarda-nacional dos municípios de Garanhuns e Buíque, ocupava a cidade com 94 homens bem armados e municiados.
Ainda sob a a tensão dos acontecimentos do dia anterior recebeu a Câmara de Garanhuns a notícia de que em dois povoados do município, Palmeiras e Correntes, os quebra-quilos, depois de quebrarem pesos e medidas, haviam apagado ou arrancado a numeração de todas as casas.
O subdelegado José Elias de Morais seguiu para Palmeiras com uma pequena força policial e alguns civis bem armados. Foram recebidos à bala, reagiram matando o suposto quebra-quilo João Fidelis e fazendo muitos feridos.
A Província, jornal liberal, publica várias cartas, principalmente do Sr. Antonio Batista de Melo Peixoto, acusando o Capitão Pedro Quer de responsável pelo morticínio em Garanhuns. Às vésperas do natal de 1874 numa longa carta publicada no Diário de Pernambuco, o Capitão Pedro do Rego Chaves defende-se das acusações de que os os tiros que deram origem ao combate teriam partido de sua casa: " É falsíssimo que o primeiro tiro tivesse partido de minha casa... partiu dos sediciosos, e foi esse o sinal da renhida luta, em cujo começo foi logo ferido o delegado que se aproximara , e mortos muitos soldados que vinham em socorro"
Na carta, Pedro Chaves informa que o quebra-quilo morto Vitoriano Reinaldo de Freitas, não era um simples tabaréu, era irmão do Padre Eulálio Ifigênio Freitas Vilela. Revela também que houve uma preparação psicológica nas feiras anteriores àquela trágica de 19 de dezembro: " De outros que não de mim devem queixar-se os parentes daquele infeliz ( Vitorino Vilela). Não fui eu de certo quem o instigou; não fui eu quem incitou o ânimo da população, aliás incrédula, ignara com embustes e aleives , fazendo-a crer na existência de impostos absurdos; não fui eu quem ia ler na feira os artigos da Província assim como um papeluxo avulso que com ela fora distribuído, em que se concitava o povo a amotinar-se lançando mão de punhal e aguarrás, e enforcando os ladrões nos lampiões; não fui eu finalmente quem preparou a massa explosiva, cujos efeitos são esse sangue derramado, que deve cair sobre a cabeça dos perversos e hipócritas. Sofri incômodos , inquietações, prejuízos pois que as minhas barracas , como as dos demais da feira, foram escangalhadas, as fazendas e artigos roubados. Entretanto houve dois comerciantes felizes: um irmão e um cunhado do Sr. Antonio Batista de Melo Peixoto não sofreram prejuízos, suas barracas foram respeitadas. "
São muitos os relatórios e ofícios de promotores que procuram dar conta das revoltas provocadas na feira pela população inconformada com o novo sistema.
O ofício do promoto Público Francisco Caracciolo de Freitas para o presidente da Província Henrique Pereira de Lucena, informa: " O Capitão Pedro Chaves atirou e mandou atirar sobre o povo que o agrediu em sua casa e estava procedendo contra a lei; mas é certo que ele não foi agredido com bala e empregou estas para defender-se; que o soldado foi morto por uma bala saída da casa dele; que desta mesma casa saiu uma bala que foi ferir um inocente rapaz que entrava em uma casa fronteira à do referido Capitão"
O Globo -dedicado aos interesses do comércio, lavoura e indústria Rio de Janeiro -Ano II, n. .32- segunda-feira- 01 de fevereiro de 1875 |
O ofício do promoto Público Francisco Caracciolo de Freitas para o presidente da Província Henrique Pereira de Lucena, informa: " O Capitão Pedro Chaves atirou e mandou atirar sobre o povo que o agrediu em sua casa e estava procedendo contra a lei; mas é certo que ele não foi agredido com bala e empregou estas para defender-se; que o soldado foi morto por uma bala saída da casa dele; que desta mesma casa saiu uma bala que foi ferir um inocente rapaz que entrava em uma casa fronteira à do referido Capitão"
O Capitão Pedro do Rego Chaves é acusado de muitos atos de despotismo realizados em Garanhuns. É importante não fazer confusão com outro contemporâneo seu, de mesmo nome, Pedro do Rego Chaves Peixoto, homem comedido, pai do Dr.Severiano do Rego Chaves Peixoto, advogado e político em Garanhuns.
As revoltas eclodiram em muitas cidades do interior de Pernambuco e foram sendo debeladas paulatinamente à medida que ocorriam. Segundo um contemporâneo "nunca ideia alguma imperou com mais força no crânio de um povo, como esta de quebrar os quilos e acabar com os impostos".
FONTES:
SOUTO MAIOR, Armando, Quebra-Quilos: Lutas Sociais no Outono do Império- 2.ed.- São Paulo: Ed. nacional,1978
A PROVÍNCIA- Órgão do Partido Liberal- 1874
O GLOBO -dedicado aos interesses do comércio, lavoura e indústria
Rio de Janeiro -Ano II, n. .32- segunda-feira- 01 de fevereiro de 1875
MINISTÉRIO PÚBLICO DE PERNAMBUCO: Promotores- O Cotidiano em Defesa da Legalidade: a sedição dos quebra -quilos-Transcrição de documentos manuscritos(1974 a 1875)- Volume IX- Arquivo Público Estadual Jordão Emereciano. pg 135 e 150.
http://anpuh.org/anais/wp-content/uploads/mp/pdf/ANPUH.S24.0719.pdf
As revoltas eclodiram em muitas cidades do interior de Pernambuco e foram sendo debeladas paulatinamente à medida que ocorriam. Segundo um contemporâneo "nunca ideia alguma imperou com mais força no crânio de um povo, como esta de quebrar os quilos e acabar com os impostos".
FONTES:
SOUTO MAIOR, Armando, Quebra-Quilos: Lutas Sociais no Outono do Império- 2.ed.- São Paulo: Ed. nacional,1978
A PROVÍNCIA- Órgão do Partido Liberal- 1874
O GLOBO -dedicado aos interesses do comércio, lavoura e indústria
Rio de Janeiro -Ano II, n. .32- segunda-feira- 01 de fevereiro de 1875
MINISTÉRIO PÚBLICO DE PERNAMBUCO: Promotores- O Cotidiano em Defesa da Legalidade: a sedição dos quebra -quilos-Transcrição de documentos manuscritos(1974 a 1875)- Volume IX- Arquivo Público Estadual Jordão Emereciano. pg 135 e 150.
http://anpuh.org/anais/wp-content/uploads/mp/pdf/ANPUH.S24.0719.pdf
Olá, Rosilda! Excelente a postagem e todo o blog! Parabéns pela qualidade da informação! Olhe, como você se interessa, porque não vem nos ajudar no Instituto Histórico. Acabamos de fundá-lo e seria muito bom contar com o seu reforço em nossos quadros!
ResponderExcluirObrigada Igor, pelo convite. O Instituto Histórico de Garanhuns é uma excelente iniciativa e necessária para preservar a história da nossa cidade e da nossa gente. Estou a disposição para cooperar com as atividades na medida do possível, uma vez que a geograficamente estou muito distante da nossa terra. Abraços.
ExcluirParabéns! Está muito interessante e bem escritoe estruturado. Sabes q adoro ler estas histórias, de acontecimentos de outros tempos. E com extratos e fotos de jornais da época! Que maravilha! Parabéns e espero q continues a escrever; serei um leitor atento deste lado do Atlântico.
ResponderExcluirOlá Rosilda! Interessei- me pela leitura do seu blog, e quero lhe fazer uma pergunta: É sobre Brejão- PE. Sabes algo a respeito da família Veras que morou e alguns se casaram lá? Obrigado pela atenção.
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